ATENÇÃO
O objetivo desse conteúdo é descrever uma perspectiva individual (em específico) sobre drogas. Nós, do Insônia, reforçamos que não incentivamos o consumo ou a banalização de toda e qualquer droga, seja lícita, ilícita ou solícita.
Equipe Insônia
Direção - Léo Souza
Roteiro - Léo Souza
Audiovisual - Léo Souza
Direção de arte - Eu mesmo
Criação - Ninguém, porque Léo Souza defende a teoria da evolução.
Sim, mais uma vez eu aqui falando sobre drogas. Coloquei uma caixa de pergunta no meu instagram pedindo para pessoas sugerirem temas e, impressionantemente, a imensa maioria sugeriu "Legalização". Então, para alegrar esse mar de nóisas frequentadores do Insônia que pediram que eu falasse sobre legalização das drogas (duas pessoas) aqui vai.
Sempre que alguém toca nesse assunto, eu assumo um posicionamento radical logo de início. E falo "radical" no seu sentido etimológico, que significa "relativo a raíz" ou, simplesmente, "raiz". Infelizmente, hoje, pessoas usam essa palavra de modo perjorativo para xingar alguém de intransigente, fanática ou que ainda não saiu da infanto-juventude inconsequente e, por isso, arrisca a sua integridade física fazendo coisas perigosas e completamente desprovidas de qualquer razão minimamente plausível, colocando sua vida e a de outras em risco, exemplo: Ser pobre e achar que é capitalista. Mas nesse texto, pretendo fazer algo mais didático.
Partirei do pressuposto que, você leitor, concorde comigo que as drogas sempre existiram na humanidade e nós, seres humanos, sempre tivemos relações diversas com elas. Caso discorde, aconselho dar um google. Seja para a medicina, seja para rituais religiosos ou até mesmo como estimulante bioquímico para as inúmeras batalhas que a humanidade precisou e precisa enfrentar, desde caçar um mamute até a não surtar por ser pobre e morar no Brasil, as drogas sempre fizeram parte da nossa existência. De fato, também sempre houvera casos de abuso e dependência por parte de algumas pessoas. A partir desses fatos, irei agora destrinchar minha opinião sobre o assunto.
Algumas pessoas utilizam o argumento de "fazerem mal" para defender o proibicionismo, como se tal fato fosse o sufiicente para zerar o número de usuários. Nesse caso, por que não proibirmos também tantas outras coisas que fazem mal, como açúcar refinado, tabaco, álcool, opióides sintéticos, agrotóxicos, papel higiênico áspero ou homens brancos de classe média que se acham interessantes o suficiente para criarem um podcast? O fato de "fazer mal", por si só, não define se aquilo deve ou não ser proibido. Outro ponto é que não podemos colocar todas drogas na mesma caixinha, como se todas elas fossem igualmente maléficas e que qualquer tipo de uso é nocivo.
Imagine um medicamento que é utilizado constantemente, todos os dias, em milhares de pessoas distintas de modo seguro, trazendo um bem-estar ao enfermo, ou auxiliando na recuperação e/ou combate a doença. Porém, em um caso distinto, o mesmo medicamento foi administrado em um paciente que possuia uma alergia desconhecida a alguma substância da droga e isso o levou a óbito. Certamente a sociedade não iria proibir o uso desse medicamento. Talvez exista uma necessidade de estudá-la melhor, compreender quais efeitos adversos, interações com outras doenças ou com predisposições genéticas, etc, etc.
Quando levamos essa compreensão para o discurso sobre legalização, entendemos que, com tantos estudos científicos comprovando a segurança de seu uso, algumas drogas não possuem embasamento algum para serem proibidas. Mas por que são? Bem, esse assunto é denso e capilarizado em diversos aspectos: Racismo, ignorância, religião, capitalismo... Então deixemos pra outro momento.
"Ah Léo, então você é a favor da legalização da maconha?". Sou! E acho que a questão da Cannabis na sociedade já está bem mais que clara do motivo de pessoas ainda criminalizarem o usuário e a própria planta em si. Mas o meu objetivo aqui não é falar mais do mesmo. Então vamos para além da maconha. Vamos falar de drogas mais danosas.
Antes mesmo de chegar à questão da legalização, preciso tocar no assunto da criminalização do usuário de droga ou dependente químico. Todos nós temos, por alto, uma leve compreensão do que é a realidade de um dependente químico em crack. IST's, prostituição, crimes… Tudo aquilo que vemos, frente aos nossos olhos ou por meios de comunicação, acontecer com as pessoas que moram no LeParc.
Então quer dizer que o crack faz a pessoa desgraçar a sua vida? É óbvio que não. Nossa visão dos usuários de crack é muito microscópica e sectária. Sejamos honestos com nós mesmos e tenhamos o mínimo de bom senso pra entender que, nem todas as pessoas que fumam pedra, se tornam moradores de cracolândia, criminosos, violentos ou qualquer outro adjetivo negativo que sai da boca de um ex-militar adúltero, enquanto termina sua oitava dose de whisky em mais uma quarta-feira ensolarada. Existem médicos, professores, cientístas, engenheiros e vários outros profissionais com boa qualidade de vida (não sei nem porque coloquei cientista como alguém que vive bem), que consomem diariamente o crack, sejam dependentes ou não. A questão é que, grande parte das pessoas que consomem crack não irão falar abertamente sobre o assunto, justamente por ter a consciência do preconceito que a sociedade têm. Preconceito esse muito bem desenvolvido por uma mídia burguêsa que possui influência direta de outros setores da burguesia, como a indústria farmacêutica por exemplo.
Diferente de drogas ilícitas, existem campanhas estatais que buscam levantarem dados de consumo e distribuição das drogas lícitas (álcool e tabaco). Essa campanhas proporcionam, aos órgãos interessados (como o Ministério da Saúde), dados robustos sobre quantas pessoas consomem determinada droga, quantas possuem doenças ou predisposições que possam agravar os efeitos adversos causados pelo consumo e, principalmente, um mapeamento de "quem é o consumidor" (faixa etária, condição econômica, profissão, idade, antecedentes criminais, etc). Seu pastor pode até não saber que você anda tomando umas birita na encolha, mas acredite, o SUS sabe!
Com esses dados, conseguimos entender como e quais medidas tomar para amenizar os efeitos negativos e o consumo indevido de uma determinada droga. O que não acontece quando temos elas proibidas por lei. Proibir uma droga é, nada mais nada menos, cagar no chão de um camarim, limpar com uma toalha e esconder atrás do microondas.
"Parabéns às drogas por, mais um ano consecutivo, vencerem a guerra!"
Bom, acho que já contextualizei demais e pouco falei sobre o que acho. De fato, algumas drogas precisam de mais algumas décadas de estudos para que possam circular livrimente no comércio de modo seguro. Porém, tampouco defendo que proibir é o único ou melhor caminho. A proibição possui um interesse bem “claro”, literalmente. Proibir algo que já é historicamente consumido, faz com que o seu comércio se torne problema de segurança pública e, mesmo que eu, você e os pilotos da FAB saibam qual a origem do tráfico, obviamente que o policial fardado e de balaclava, não vai invadir uma casa de luxo, no bairro mais nobre da cidade do Rio de Janeiro, para prender Deputados, Empresários e/ou outros militares que traficam drogas. Mas, ainda assim, em um país onde "brasileiros pós-ditadura ainda se encontram em estado de coma semi-profundo", existe um sentimento que perpetua o âmago daqueles de bom coração que amam Deus, a pátria e a família (exceto o filho com a amante), que é: Bandido 'bom' é bandido morto.
Então temos um estado burguês, descendentes de escravocratas senhores de engenho controlando esse estado e um imenso refluxo gástrico de toda merda que foi enfiada cu acima na cabeça vaga da população ignorante, ao longo de 19 anos de ditadura civico-militar burguêsa. Pode até ser doloroso, mas é necessário entender que vivemos em um país majoritariamente racista! E olhe que não estou falando de pessoas que perpetuam ideias racistas por falta de interesse ou letramento. Estou falando de racistas intrapessoalmente convictos, que sentem tesão em verem um negro tomando tiro.
Apesar disso, vivemos em uma sociedade democrática, global e que compreende que tais atitudes são execráveis e repudiantes. Eis que então, surge a genialidade do capitalismo fascistóide: Por que não terceirizar o tráfico nas favelas e manda o PM, preto e favelado, subir o morro pra trocar tiro com o traficante, também preto e favelado? Pro estado e pra uma parcela da sociedade racista ou acéfala, tudo bem a policia matar dezenas de crianças negras em uma operação, contanto que apreendam alguns quilos de maconha.
"Ainda bem que maconha não dá em árvore"
A criminalização, não é uma medida combativa, mas sim exclusivamente racista! Uma ferramenta muito bem orquestrada para ações eugenistas. Uma verdadeira limpeza social a base de bala, sangue e lágrimas. Criminalizar, combater o tráfico matando favelado, nunca resolveu e nunca resolverá o problema da sociedade com o abuso de drogas. E aqui vem meu posicionamento "radical" em relação ao assunto: Eu, por mim, sem tomar minha opinião como certeza absoluta e imutável, sou a favor da descriminalização do usuário de qualquer droga que seja, e da legalização e regulamentação das mesmas. Isso mesmo, todas! De cocaína a guaraná Dolly. Todas. E veja bem, legalização com regulamentação, não é necessariamente comercialização da droga para uso adulto (uso "recreativo").
No meio dos anos 80, a Europa começava a entrar em um terrível quadro de consumo de heroína. Uma droga altamente viciante, prazerosa e nociva. Além dos problemas diretos da droga, o compartilhamento de material perfurante (agulhas e seringas) entre os usuários, aumentou substâncialmente os casos de várias infecções sexualmente transmitidas (IST's), sendo o HIV a mais letal. Enquanto que alguns países aumentavam suas políticas ostensivas de combate à droga (leia-se ao usuário), em 1991, a Suíca mudou por inteiro sua política de drogas, passando a tratá-la como questão de saúde pública ao invés de segurança. Como fizeram isso? Oferecendo drogas para os dependentes químicos!
A partir do momento que o governo suíço começou a tratar seus usuários como doentes (e não criminosos), o estado começou a produzir sua própria heroína, de modo seguro e controlado. A partir daí, casas de acolhimento aos dependentes químicos foram instauradas para abrigá-los e reduzirem os problemas mais danosos: A overdose e a AIDS. Seringas estéreis eram doadas aos dependentes, segurança, alimentação, tratamento psicológico e acompanhamento médico durante o consumo. Em pouco menos de 20 anos, o número de novos dependentes químicos por ano reduziram em 80% e o número de soropositivo, 65%. Essa política, utilizada até hoje, faz com que a Suíça seja um dos países mais avançados em combate ao consumo indevido de drogas. Uma simples política de redução de danos foi capaz de conscientizar a sociedade e de tratar e salvar a vida de uma grande parte dos dependentes químicos.
Hoje, diversos estudos vêm comprovando a eficácia de várias drogas em tratamentos médicos e terapeuticos (maconha, cocaína, LSD, cogumelos alucinógenos, etc.). Essa eficáci, cientificamente comprovada, funciona como uma faca de dois gumes: Ora em prol da legalização, ora como prerrogativa para um discurso elitista de legalizar apenas para fins medicinais.
Esse segundo ponto também, ao meu ver, em mais atrapalha no processo de evolução da sociedade brasileira no discurso sobre drogas do que ajuda. Ele é fácilmente manipulado para inferir que o uso adulto das drogas, ainda precisa ser tratado como questão de segurança pública. Ainda que, à primeira vista, essa premissa soe interessante, não podemos desconsiderar o direito individual de cada ser humano ao uso do seu próprio corpo.
O que estou tentanto dizer é que, o estado ou qualquer outra entidade pública que seja, não pode (ou ao menos não deveria) atuar como agente regulador daquilo que o indivíduo faz com seu próprio corpo, contanto que tal ação não interfira na vida de outras pessoas (como no caso das vacinas). Não seria justo, privar pessoas que utilizam determinada droga de modo responsável, apenas porque algumas pessoas sofrem ou já sofreram pelo consumo irresponsável.
"Se o uso irresponsável de algo fosse motivo para proibí-lo, todos os homens do mundo seriam desprovidos de pênis."
Não teria como minha opinião ser embasada em outra coisa que não fosse à partir do conhecimento científico que existe sobre a relação entre drogas e sociedade. No nosso cotidiano, lidamos com diversas coisas extremamente perigosas (automóveis, facas, salada de tomate com molho de glifosato) e nem por isso abolimos ela por completo do nosso cotidiano. Se bem que não seria uma má ideia abolirmos a Polícia Militar. A proibição nunca trouxe nada de positivo para a humanidade e nunca trará. Utilizar exemplos efetivos de redução de danos, conscientização por meio de ações educativas, desenvolvimento científico para aprofundamento das temáticas a cerca do assunto, essas sim são armas extremamente poderosas e eficientes no combate à dependência química.
Fica aqui um breve levantamento de dados coletados no site da OMS de coisas que mais matam pessoas no mundo (dados de 2019)
Fome - 30 milhões
Doenças cardícas - 9 milhões
Tabaco - 5 milhões
Álcool - 2.25 milhões
Acidente de trânsito - 1.35 milhões
Overdose por drogas ilícitas - 200 mil
Por fim, quero reforçar que, fora questões históricas e de senso comum, tudo o que foi dito não passa de uma opinião individual, completamente apta à discussão e aprofundamento sobre. Assim como a ciência, as pessoas mudam, suas concepções, seu entendimento, e todas elas são processos cumulativos e transformadores que fazem com que a sociedade evolua suas ações políticas (sociais, institucionais e interpessoais), à luz da ética Aristotélica. Não há nada de mais magnifico no ser humano que sua capacidade de mudar. Intransigência de ideias nunca foi sinônimo de sabedoria. Quem se diz certo, não passa de um idiota.
"O homem coletivo sente a necessidade de mudar"
Aproveitando a temática, vai aqui algumas sugestões de consumo sobre o assunto.
Livro - Drug use for Grown-Ups - Dr. Carl Hart (PhD em Neurobiologia)
Música - REMEDINHO - Planet Hemp